ESCRITOS XLV

Nos reencontramos.

Passamos a noite juntos.

Acordamos, nos olhamos.

Rimos.


Mas a meia-calça que eu estava usando na noite anterior havia rasgado. Estava frio e eu havia escolhido uma bota de couro de salto alto para ir àquele bar.

Na manhã seguinte, percebemos que estava calor e eu só tinha a roupa com que eu havia saído, por isso estava sem qualquer tipo de meia para usar, a não ser a meia-calça – essa que agora estava totalmente destruída, pois você fez a questão de rasgar ainda mais.

Resolvemos almoçar em um lugar perto, mas fomos andando. Você quis me emprestar uma meia sua, mas eu recusei. Preferi andar com aquela bota de couro no calor. Nunca fui de pegar nada emprestado dos outros. E não queria pegar aquela meia emprestada, pois se nada desse certo entre nós, eu não queria ficar com a meia. Preferi ter bolhas nos meus pés. Recusei um simples par de meias pelo medo de me entregar novamente. De ter algo que eu sabia que uma hora teria que devolver.

No fim, minha – talvez – insegurança momentânea foi se desfazendo com o passar dos dias. Voltamos a doar nosso tempo diário em meio de conversas e risadas e planos. E com isso minhas expectativas foram aflorando novamente.

Me doei. Me entreguei. Me declarei. Acreditei.
Acreditei que dessa vez poderia ser diferente. Que você me veria como a pessoa que estaria ao seu lado. Mas não foi isso o que aconteceu.

Tentei ir embora, com todo meu orgulho e respeito à mim mesma. Achei que seria melhor se fosse embora naquele outro dia, assim não estragaríamos mais o que tínhamos. Mas por insistência sua, decidi ficar. E me arrependo. Depois de tanta conversa e aos meus olhos, acertos, você foi viajar e me deixou aqui, sozinha, apenas com as minhas ilusões do que poderíamos fazer juntos. E o bonito de tudo, se esvaiu entre meus dedos.

Noites em claro, músicas que escuto e me fazem sentir dor no peito.

Como que eu poderia deixar você tocar na minha pele, encostar nos meus lábios, sabendo que você havia feito o mesmo com outra pessoa? A imagem que passou na minha cabeça, me corroeu por dentro.

Não dá mais para viver com esse sentimento de insuficiência. Não posso mais pensar que eu não fiz de tudo para provar, de alguma forma, meu valor. São escolhas da vida, você fez a sua e consequentemente eu fiz a minha.

Quando a saudade bater em sua porta, como bate aqui, espero que lembre do par de meias. Este conto não é sobre a meia, mas sim do coração.

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